Reconheçamos – muitas pessoas estão assustadas com as perspectivas de crise e escassez.
Alguns de nós correm risco de desemprego, ou têm ocupações mal remuneradas, mas a maioria simplesmente se depara com o facto nu e cru de ter acesso a menos bens e coisas do que costumava ter. Pela primeira vez desde o ‘boom’ económico do pós-guerra, a nova geração não pode aspirar, no geral, a ter maiores salários e regalias do que os seus pais.
Para quem se habituou a encontrar no consumo uma fonte de satisfação emocional, o panorama pode ser mesmo assustador.
Não é em vão que se chama aos centros comerciais as catedrais do consumo. A verdade é que os portugueses se habituaram a padrões de consumo do 1º mundo com toda a carga de desperdício que isso implica.
Todavia, como seres humanos, nós precisamos de relativamente pouco, sendo essenciais o abrigo, a alimentação e o relacionamento social.
No que se refere à satisfação e bem estar, vejamos as 6 necessidades humanas, tal como definidas por A. Robbins, um dos nomes famosos da PNL americana:
1-Estabilidade e os seus sucedâneos: segurança e conforto
2- Diversidade (inclui um grau de imprevisibilidade)
3- Significância (ser considerado pelos outros, ser-lhe atribuída importância)
4- Conexão (amizade, relacionamentos, amor)
5- Contribuição (dar algo de seu para a comunidade, contribuir para o bem geral)
6- Crescimento (aumentar o seu auto -conhecimento, progredir e descobrir)
Demasiadas pessoas têm dificuldade em satisfazer todas estas necessidades de uma forma gratificante e algumas até negam que precisem da sua satisfação. Quantas não afirmam que não carecem de conexão, protegendo-se com o egoísmo ou o isolamento? Outras desprezam o crescimento, enquistando-se no seu pequeno mundo, fechado e aparentemente protegido.
E onde entra aqui o consumo? Qualquer actividade se pode tornar aditiva se preencher pelo menos três das necessidades humanas. O consumo, que é a actividade de apropriação de bens ou serviços, pode dar-nos a ilusão de satisfazer todas elas. Como?
Ter mais coisas pode dar-nos a sensação de:
- Segurança e conforto.
- Significância: Eu exibo a posse de bens, eu sou um vencedor, eu sou apreciado pelos outros, uma parte de mim reafirma-me como uma pessoa capaz de vencer na vida.
- Conexão. As coisas podem dar-nos a ideia de pertencer ao clube das pessoas que lhe têm acesso. Este fenómeno explica o sucesso das marcas de produtos raros e de luxo.
– Crescimento. Verifica-se no consumo compulsivo de cursos e terapias. Eu (Carlos Baltazar) dou consultas e faço formação, mas devo dizer que muitas pessoas saltam de curso em curso à procura de satisfazer esta necessidade, muitas vezes sem um forte critério de qualidade e integração de resultados.
Em outro nível, o consumo fornece-nos um reforço instantâneo de auto-estima e poder. Quanto dura? O resultado é um prazer rápido, mas de muito curta validade tornando-se necessário repetir o acto de consumo frequentemente.
Mais grave, a expectativa de virmos a passar por um período eventualmente longo de menor acesso a bens incomoda-nos porque fomos ensinados a identificar a posse de coisas com qualidade de vida.
Torna-se então premente reavaliar os nossos valores, crenças e procedimentos de forma a não precisarmos do ‘chuto’ de químicos neuronais que advém do consumo e obtermos contentamento de outras formas.O que podemos fazer?
Entre outras coisas:
• Desidentificar o consumo com a qualidade de vida. Há tantas coisas grátis ou muito baratas, sem custos ambientais. Passear a pé, visitar monumentos e museus, frequentar bibliotecas públicas, assistir a palestras e tertúlias gratuitas, etc…
• Assumirmos mais ecologia na nossa vida diária, tirando prazer do exercício do consumo esclarecido.
• Olhar para as seis necessidades humanas e pensar como satisfazê-las de uma forma que nos torne mais resilientes.
• Entender que a felicidade é um estado de libertação de condicionamentos e do medo, não um estado que depende de conseguir objectivos materiais.
Tornar a auto-imagem e identidade firmemente baseada em convicções ilimitadas e ligadas a um forte sentimento de pertença e missão.
• Escolher criteriosamente os seus objectivos, com foco nos resultados, dando nemos importância a expectativas que não dependem de nós.
• Valorizar e honrar as pequenas coisas da vida, que se encontram sempre em nosso redor e que passam tão despercebidas…
Descoisifiquemo-nos e respiremos melhor o ar puro da liberdade
Carlos Baltazar
Publicado em 11/12/2020